quarta-feira, 21 de maio de 2008

O Homem com uma Câmera Invisível



Uma palestra ou uma peça de teatro? Eu escolhi aquela sobre a qual sabia menos - não sabia o horário, nem o nome, nem como chegar ao lugar onde iria acontecer. Que tipo de pessoa escolhe sempre o incerto na vida? Robert Frost explicou em versos. E precisava mesmo explicar? Resolvi não definir meu traçado antes de sair de casa, mas sabia que à palestra do Bráulio não iria. A história em forma de cordel em minha cama estava e nela permaneceu...


O estrago ou efeito de uma crônica de Marte era tão vasto? Tão vasto ao ponto de escolher algo vivo, algo mutável para compor a cena seguinte? A resposta é óbvia, mas o óbvio não é óbvio até que veja visto e mencionado. O óbvio não é óbvio até que seja vivido. A minha estrada começou a ser definida quando, após subir as escadas da Brigadeiro, pisei na Paulista. Antes de vislumbrá-la ouvi meu nome ainda dentro da estação - pronunciado por alguém que durante quase dois meses tive o prazer de lhe dizer 'bom dia':

"Você tem poucos medos". Sim, eu tenho poucos medos e assusto pessoas. Assusto até aquelas que fazem parte de um universo paralelo...

"Teatro é ação". Sim, a paulista. A Paulista estava um caos:

"Hey, por favor, para onde foi a parada de ônibus que costumava ser aqui?"

E ele respondeu: "mais na frente, bem mais na frente".

Melhor seria ter descido no Paraíso... O inferno não seria visto. E como não poderia deixar de ser, passo em frente ao futuro do presente do Bráulio Tavares. O futuro do presente "é usado para indicar uma ação que irá acontecer com certeza"... E quando temos essa certeza? Tempo estranho... Muito estranho... Escolha estranha... Personagem do Hugh Grant em Quatro Casamentos e Um Funeral parado no meio de uma estrada... Frost mais uma vez, fuck!

Ao me deparar com o futuro do presente pensei: a partir daqui começo a desenhar o meu caminho. Ele começava a ser definido a partir de um tempo inusitado e que não tem nenhum sentido.


- "Por favor, Sacomã passa por aqui?"

- "Sim, já passaram três. Ops, não, acho que foram apenas dois..."

- Esse ônibus passa na Unesp?

- Você pegou o ônibus errado! É o 478 P - 10. Perdida no Paraíso. Sem nome, sem hora e sem destino.


- "Por que você não admite logo que não sabe de porra nenhuma?!".
Eu já tinha visto esse filme. Melhor que isso: eu estava nesse filme, semana passada, quando consegui perder o horário de duas peças numa mesma noite! Durante o trajeto nada curto até o teatro, imaginava, para matar o tempo, como o final seria. O final para o meu futuro:

1. Não iria ver peça alguma. Não encontraria o lugar.

2. O Teatro estaria vazio e todos já teriam seguido seus caminhos.

3. Desceria do ônibus e voltaria para o futuro... do presente.

4. Não consigo pensar em nada mais... O amigo do Hugh Grant que falava por sinais disse o mesmo...


Por que alguém escolhe algo que não conhece?

- Ah, lembrei! Tinha um piano! Sim, um cego que tocava piano! É, mais uma vez, a música. A música me moveu:


"You move me, you move me
With your buildings and your eyes
Autumn woods and winter skies
You move me, you move me
Open sea and city lights
Busy streets and dizzy heights
You call me, you call me."


Na verdade, não foi nessa música que pensei... Na verdade, ninguém me ligou, mas e daí? Eu fui pelo o que estava a fim de fazer e não pelo que esperavam que eu fizesse; não podemos controlar tudo e observar isso foi deveras engraçado... Imperfeito do conjuntivo... No teatro da vida existe um texto, porém o improviso predomina, de longe!

- Está cansada? Ele perguntou.

- Sim, eu vim correndo, mas eu sei que não adiantou nada. A peça acabou, né?

- Não, não! Respire, relaxe. Vire à direita, na porta de vidro. Não tem como errar...


Era um cenário preto. Com giz, os personagens traçavam sua história. Desenhavam a história. A vida imita a vida. A arte imita a arte... Assim seguimos. Eu fiz uma escolha. O diretor também. Em algum ponto num espaço-tempo não definido nos encontramos. Sabíamos?

- Nãão! Não sabemos de nada! Somos todos iludidos!
- Sabemos da ilusão?


A morte sabe - homem, mulher, Bergman, Allen, xadrez, cartas, esqueleto, sapato vermelho, caixas... "eu volto!". Ela sempre volta. E nunca sabemos quando isso acontecerá.


Acordei num lugar estranho. Os versos do Jeff nunca fizeram tanto sentido:


"Well, this is my story for the dislocated
You're gonna love, but you're doomed to be hated
Because the lies of the spirit possessed her!
Because the eyes of your lover resist you
Listen up, you keep your aim steady
As your temple turns to kiss the pistol
Fate is gonna find your love
In a glass of champagne"

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