sábado, 3 de maio de 2008

As Várias Faces de Dylan


Todd Haynes nasceu em 1961 na cidade de Encino, Califórnia. Ouviu a música de Bob Dylan pela primeira vez ainda adolescente. A idéia de fazer um filme sobre o polêmico e multifacetado compositor o perseguiu desde o século passado. Através do filho mais velho do Dylan, Jesse, Todd conseguiu conversar por telefone com o empresário Jeff Rosen. Jeff por sua vez, logo alertou Todd de não usar no roteiro expressões como: “a voz de uma geração” ou “gênio do nosso tempo”. Alguns meses depois um telefonema de Jeff informava que Dylan tinha concordado em liberar os direitos, mas com uma condição: além do filme, o roteiro deveria ser também uma peça teatral.

E assim nasceu ‘Não Estou Lá’ (I´m Not There, EUA, 2007) com Cate Blanchett, Christian Bale, Marcus Carl Franklin, Ben Whishaw, Richard Gere e Heath Ledger, todos interpretaram o mesmo personagem: Bob Dylan. O filme estreou nessa sexta-feira em Recife, mas permanece inédito nas telas da nossa cidade.

A história de Bob Dylan com a música começou depois que ele ouviu Drifting to Far from Shore: “o som do disco fez com que eu me sentisse outra pessoa... Parecia que nem mesmo nasci com os pais certos, ou algo assim.”. Trecho do filme No Direction Home de Martin Scorsese. A música cantada pelo criador do estilo bluegrass, Bill Monroe acionou o processo de se reinventar do, ainda então, Robert Zimmerman.

Na tela o diretor desfragmentou o enigmático Dylan em seis personagens: A atriz australiana Cate Blanchett fez Jude Quinn, o “cantor de protesto” que se revoltou contra esse rótulo e passou a cantar sobre o cotidiano. O público, por sua vez, passou a considerá-lo traidor pelo uso de instrumentos elétricos em sua música; Ben Whishaw, que fez o papel de Keith Richards no filme Stoned (ver destaque), encarnou Arthur Rimbaud, o Dylan poeta e leitor voraz de livros; Christian Bale interpretou Jack Rollins, personagem visto apenas através de fotos e filmes, registros de um compositor que deixou para trás sua carreira no auge do sucesso para se tornar o religioso Dylan, criador de Knockin´on Heavens Door e mais tarde a trilogia Slow Train Coming, Saved e Shot of Love; Heath Ledger fez Robbie Clark “o novo James Dean, Marlon Brando e Jack Kerouac em uma só pessoa”.

No filme, Robbie Clark interpretou Jack Rollins no cinema, uma citação ao desconhecido Renaldo e Clara, (ver destaque); Richard Gere fez o Dylan fora-da-lei que atuou e concebeu a trilha sonora para o filme de Sam Peckinpah, Pat Garret e Billy the Kid (1973), uma referência a fuga da vida pública e Marcus Carl Franklin como Woody Guthrie que representou toda a jornada de Dylan na absorção da musicalidade e personalidade do cantor folk Woody Guthrie.
Os seis Dylans se misturam aleatoriamente durante todo o filme, tornando-o difícil para quem não conhece, pelo menos, 70% da vida do compositor, principalmente, porque Todd Haynes usou um formato não convencional para um filme biográfico.

O diretor também fugiu da obviedade na escolha das músicas da trilha sonora de Não Estou Lá. A começar pela canção que dá título ao filme I´m Not There de 1956, gravada durante as sessões do Basement Tapes e disponibilizada apenas em bootlegs; como também nas versões escolhidas para as músicas de Dylan feitas pelos grupos Calexico e Antony & The Johnsons.

Durante a confusa turnê inglesa Bob Dylan diz: “Vou ser um novo Bob Dylan na semana que vem. Arranje-me um novo Bob Dylan e use-o. Use o novo Bob Dylan e veja o quanto dura”. Não sabemos ao certo quais dos dylans, entre tantos, mas tem durado até hoje; tornando assim, a versão cinematográfica de Todd Haynes na visão mais próxima de quem seja, realmente, Bob Dylan.

Dylan dirigiu filme obscuro em 1978

Renaldo e Clara (Renaldo and Clara – 1978). Dirigido, escrito e estrelado por Bob Dylan. O filme, considerado pela crítica como “surreal, obscuro e pretensioso”, é formado por três partes: a turnê Rolling Thunder Revue, o documentário sobre Ruben “Hurricane” Carter e a parte ficcional onde Bob Dylan fez o Renaldo e Sara (sua mulher na época) fez o papel de Clara. Inicialmente o filme tinha 292 minutos de duração. Logo após o lançamento Dylan permitiu uma edição, onde manteve mais o material da turnê, de aproximadamente duas horas. Curiosidades sobre o filme: Uma parte foi lançada para o público como bônus na The Bootleg Series Vol.05 – Bob Dylan Live 1975; é o primeiro filme de Sam Shepard que dividiu o roteiro com Dylan; no elenco, além de Dylan e Sara, tem Joan Baez, Joni Mitchel, Allen Ginsberg, Arlo Guthrie (filho do Woody Guthrie), Harry Dean Staton e Roberta Flack. O filme estreou no Brasil no final dos anos 70, mas nunca foi lançado posteriormente em nenhum formato.

Publicada no Jornal da Paraíba, Segundo Caderno, 13 de abril de 2008.

OITO FILMES QUE VOCÊ PRECISA VER

Essa Terra é Minha Terra (Bound for Glory -1976). Direção de Hal Ashby.
A vida do compositor folk Woody Guthrie interpretado por David Carradine. O filme trata do período que Guthrie saiu país afora cantando suas músicas de cunho social para os oprimidos e vítimas da depressão americana. Vencedor de dois Oscars: fotografia e adaptação musical.







Johnny & June (Walk the Line - 2005). Direção de James Mangold. Filme sobre a vida do compositor Johnny Cash. “Johnny Cash era como uma figura religiosa para mim. Conhecê-lo foi a maior emoção da minha vida. E só o fato de ter cantado uma das minhas músicas foi inimaginável”, palavras do Bob Dylan no “No Direction Home”.







La Bamba (La Bamba – 1987). Direção de Luis Valdez. História da curta trajetória musical de Richie Valens que se tornou famoso ainda adolescente e morreu em acidente aéreo junto com Buddy Holly e J.P. Richardson. A trilha do filme é executada pelos Los Lobos. O filme tem também as participações do guitarrista Marshall Crenshaw (esteve no Brasil junto com o MC5) no papel de Buddy Holly e Brian Setzer (ex-Stray Cats) como Eddie Cochran.





The Doors (The Doors - 1991). Direção Oliver Stone. O filme mostra desde o surgimento da banda americana The Doors nas areias da praia de Venice até a morte de Jim Morrison num hotel em Paris aos 27 anos. Durante as filmagens o ator Val Kilmer se recusou a sair do personagem, talvez por saber que seria seu único papel relevante no cinema e aproveitou ao máximo. Há boatos que precisou de tratamento psiquiátrico para se desvincular de Jim Morrison. Estranhamente nunca saiu em DVD no Brasil. Com participações de Billy Idol, John Densmore e Eric Burdon.




A Rosa (The Rose – 1979). Direção de Mark Rydell. Bette Midler em seu primeiro papel no cinema interpreta a cantora Mary Rose Foster inspirada na vida/carreira de Janis Joplin. No elenco a presença de Harry Dean Staton (que aparece no Renaldo e Clara do Bob Dylan), Frederic Forrest e Alan Bates. O mesmo diretor dirigiu em 1991 outro filme com a Bette Middler, chamado Para Eles, Com Muito Amor (For the Boys) onde ela canta uma versão emocionada de In My Life.




A Fera do Rock (Great Balls on Fire – 1989). Direção de Jim McBride. A ascensão e temporária queda do rocker Jerry Lee Lewis nos anos 50 interpretado por Dennis Quaid. Participação de John Doe, ex-baixista da banda X, de Los Angeles, Califórnia, que canta Pressing On na trilha sonora de Não Estou Lá.







Os Cinco Rapazes de Liverpool (Backbeat – 1993). Direção de Iain Softley. Filme que narra a história do artista plástico e péssimo baixista Stuart Sutcliffe da banda embrionária do que veria a ser os Beatles. Ótima atuação de Ian Hart como John Lennon. Trilha sonora executada pelo David Grohl do Foo Fighters na bateria, Mike Mills do R.E.M. no baixo, Thurston Moore do Sonic Youth na guitarra e Greg Dulli do Afghan Whigs e Dave Pirner do Soul Asylum nos vocais.





Stoned – A História Secreta dos Rolling Stones (Stoned – 2005). Direção de Stephen Woolley. Primeiro filme do produtor inglês que conta a vida de Brian Jones, membro fundador da banda Rolling Stones que morreu em circunstâncias mal explicadas. O filme de Woolley retoma a teoria de assassinato.

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